Lady Snowblood é um filme de 1973 dirigido por Toshiya
Fujita e inspirado no mangá homônimo de grande sucesso de Kazuo Koike, autor de
Lobo Solitário. Ainda não li o mangá, então não sei se é uma adaptação fiel ou
se o diretor tomou muitas liberdades criativas, mas tendo feito isso ou não, é
inegável que este é um grande filme, não é atoa que foi a maior inspiração para
Kill Bill de Quentin Tarantino.
O filme se passa nos primeiros anos da Era Meiji
(1868-1912), que foi o período onde o Japão deixou de ser um país feudal e
passou a ser Imperial. Os samurais haviam sido extinguidos por conta de
reformas do imperador, e apesar da resistência, foi formado um exército
nacional para promover o país como uma futura potência, assim como foi feito no
ocidente. Nesse contexto, Sayo Kashima teve sua vida e família arruinadas por
quatro criminosos que realizavam golpes em camponeses, e para se vingar deles,
deu a luz à Yuki (Meiko Kaji), a criança do submundo que nasceu para a vingança
e que no futuro viria a se tornar Lady Snowblood.
Após o nascimento de Yuki, temos uma cena em que ela
confronta alguns bandidos e nesse momento temos um dialogo que resume bem a
trama do filme:
- Quem é você?!
- Vingança.
- De quem?
- De todas as pessoas indefesas que sofreram graças a você.
O que Yuki busca é mais forte que ela mesma e que qualquer sentimento,
não há nada que possa impedi-la de alcançar seus objetivos, é uma maldição que
está marcada em sua alma desde seu nascimento. Tudo que ela busca é vingança.
Para concretizar essa vingança ela vai atrás de todos os
quatro capangas que foram responsáveis pelo trágico fim de sua família, e em
sua trajetória somos constantemente relembrados de sua impiedade e
determinação. Mas ao contrário do que seu mentor disse, ela não é “uma fera, um
demônio, algo que se disfarça de humano”, a personagem passa por cima de todos
os seus sentimentos para realizar seus objetivos e sempre que é colocada a
prova, é impiedosa e faz o que for necessário para honrar o nome de sua família
através da morte dos que a desonraram. Ainda assim, é visível que Yuki sente
remorso quando suas ações afetam a vida de outros, mas como ela mesma sabe, não
tem como voltar atrás, o segundo capítulo desenvolve bem esse lado da trama e
se chama “Bambu que Chora Bonecas do Submundo”. Shurayuki, como é chamada posteriormente,
é movida unicamente pela ira dos que se foram, o que torna sua vida cada vez
mais vazia conforme o fim de sua jornada se aproxima.
É muito interessante ver como os japoneses utilizam como
inspirações diversas lendas japonesas em suas obras, e a que teve vez neste
filme foi a da Yuki-onna, tanto em relação às características da personagem,
quanto em questões visuais, como na última cena do filme. Inclusive, por este motivo decidir nomear essa resenha como "O Demônio da Neve".
Deixando a trama de lado, me sinto na obrigação de falar
sobre a grande estrela do filme, Meiko Kaji. O primeiro filme que assisti com
uma participação dela foi Stray Cat Rock – Delinquent Girl Boss (1970), e desde
então tenho tido cada vez mais curiosidade para ver os filmes dela, quando vi
que ela era a estrela de Lady Snowblood fiquei ainda mais interessado em
assistir o filme, e agora já quero assistir a sequência. Meiko Kaji atuou
maravilhosamente neste filme, não consigo imaginar alguém melhor para este
papel, e a forma como ela personificou a ronin em seu caminho de vingança foi
estarrecedora.
Um fato muito interessante é que Meiko Kaji também cantou a
música tema do filme, e outra coisa que me deixou muito feliz foi saber que seu
nome voltou aos holofotes quando Tarantino utilizou sua música “Shura no Hana” em
Kill Bill, e isso acabou lhe trazendo inspiração para voltar a gravar músicas
mesmo já tendo anunciado sua aposentadoria.
Não foi apenas a música tema do filme que foi utilizada por
Quentin Tarantino, Lady Snowblood serviu totalmente de inspiração para o seu
filme. A trama centrada em uma personagem feminina muito apelona que busca
vingança contra uma gangue, as lutas coreografadas com exageros de gore pra
todo lado, a cena da luta contra O-Ren Ishii na neve, enquadramentos
específicos, entre outras coisas que vão ficando claras conforme assistimos ao
filme. Kill Bill é um filme que homenageia muitos clássicos dessa época. Um dia
pretendo escrever sobre os meus filmes preferidos do Tarantino (quase todos).
Lady Snowblood é a obra máxima de Toshiya Fujita e um
clássico do gênero chanbara e jidaigeki que se passa em um período de transição
do país e expõe muitos problemas que as classes mais baixas enfrentaram na
época. Os cenários são todos muito bem explorados e a fotografia é outro ponto
forte do filme. Espero que com essa postagem eu tenha convencido algum de vocês
a assistirem essa obra magnifica, infelizmente ela não recebe a atenção que
merece.
Se cuidem, até a próxima.
Nenhum comentário:
Postar um comentário